Espaço de emoções sentidas? Memórias?Estados de alma?Desabafos?Palavras ditas e outras que ficaram por dizer?

Tributo a poetas? Pequenas homenagens?

Talvez tudo isso ou, apenas, exorcismo e catarse da alma?


Seja como for, "esta espécie de blog" não pretende ser nada, a não ser o reflexo do que SOU e SINTO!

segunda-feira, 26 de julho de 2010

Pudesse eu ...


Pudesse eu morrer hoje como tu me morreste nessa noite
–e deitar-me na terra;
e ter uma cama de pedra branca e um cobertor de estrelas;
e não ouvir senão o rumor das ervas que despontam de noite,
e os passos diminutos dos insectos,e o canto do vento nos ciprestes;
e não ter medo das sombras,nem das aves negras nos meus braços de mármore,
nem de te ter perdido – não ter medo de nada.

Pudesse eu fechar os olhos neste instante e esquecer-me de tudo
– das tuas mãos tão frias quando estendi as minhas nessa noite;
de não teres dito a única palavra que me faria salvar-te,
mesmo deixando que eu perguntasse tudo; de teres insultado a vida
e chamado pela morte para me mostrares que o teu corpo já tinha desistido,
que ias matar-te em mim e que era tarde para eu pensar
em devolver-te os dias que roubara.

Pudesse eu cair num sono gelado como o teu e deixar de sentir a dor,
a dor incomparável de te ver acordado em tudo o que escrevi
– porque foi pelo poema que me amaste,
o poema foi sempre o que valeu a pena
(o mais eram os gestos que não cabiam nas mãos,
os morangos a que o verão obrigou);

e pudesse eu deixar de escrever esta manhã,
o dia treme na linha dos telhados, a vida hesita tanto,
e pudesse eu morrer, mas ouço-te a respirar no meu poema.


Maria do Rosário Pedreira

Sem comentários:

Enviar um comentário